A propósito de uma
simpática carta de leitor da área médica, fiquei pensando nos inúmeros anos que
gastei procurando os caminhos das minhas pesquisas. Sempre devi muito a pessoas
mais experientes, no entanto, elas só podiam me ajudar se eu tivesse construído
minhas dúvidas, as hipóteses de trabalho, o experimento e, finalmente a
conclusão, que poderia negar ou confirmar as hipóteses. Neste longo caminho
encontrei pessoas incríveis. Indiretamente, o Claude Levi-Strauss; depois,
diretamente, aqueles a quem chamo de demônios tutelares: Sérgio Buarque de
Holanda, Pedro Moacyr Campos, Victor Deodato, Heitor Guilherme Segundo Medina,
Veronesi, entre outros tantos.
Interagi sempre com colegas que estavam pelos
mesmos caminhos, reencontrei-os nos botequins da vida e, finalmente, vi meus
alunos chegando ao topo das carreiras universitárias, com tanto sacrifício
quanto eu. Mas isso tudo não passa de uma veleidade acadêmica, pois creio cada
vez mais que nascemos com a metodologia cientificamente instalada em nossos
cérebros, e a cultura mesquinha a que pertencemos apenas destrói os
pressupostos iniciais para fazer com que nos enquadremos numa estúpida moral
burguesa que chega até a negar o
biológico para instalar aquilo que chamam de "bons costumes".
Uma criança está sempre
pronta a xeretar o resultado dos seus movimentos. Se faz cocô, não vê nada
errado em experimentar a textura e o odor daquilo que o seu corpo expulsou.
Depois, com ensaios e erros, aprende a andar, e então vai sendo
"educada" para se tornar um ser social que não arrote em público,
ainda que isso lhe cause uma terrível
aerofagia. Vai à escola onde enfrenta uma alfabetização precária e leva uma
vida inteira para só então entender que a escrita foi o mais cruel instrumento
de dominação do mundo em seus primeiros avanços. Assim, quem lê mais e melhor,
tem chances de dominar e contabilizar com mais eficiência os outros grupos
sociais.
Comprei de um sebo de
Salvador, os três volumes da História Crítica da Teoria da Mais Valia, numa
edição do Fondo de Cultura Economica (México), de 1945. Marx escreveu essa
amplíssima obra antes de compor "O Capital", e seus escritos só foram
compilados no início do século XX pois ele não os considerava importantes. Estuda
dos fisiocratas a Adam Smith, passa por Ricardo, Malthus, Ramsay, Cherbuliez e Richard Jones, até estar apto à construção
de "O Capital", do qual poucos marxistas tiveram a honra de ler
completamente. Eis aqui uma demonstração de Método. Ninguém chega ao final de
um pensamento se não o houver elaborado em todos os passos. É querer demais?
Não. Somos anões no ombro de gigantes, ainda que eles mesmo não tenham idéia de
como são grandes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário