Semana passada dei uma palestra no Rotary e tive o
prazer de lá comparecer na qualidade de Historiadora. Formar um historiador é
uma tarefa difícil, pois ao longo dos tempos, mais profunda se torna a
formação, mais os campos vão se abrindo, o que requer um jogo de
multidisciplinaridade fantástico. Quando me doutorei, era "conditio sine
qua non" que a minha pesquisa estivesse suportada no conhecimento de
várias línguas estrangeiras, além do latim e das versões antigas das referidas
línguas. Realmente, não é tarefa simples dominar o "Ancient Français"
nem tampouco o latim medieval.
Mas, ao
desenvolver um tema medieval, nas entrelinhas dos documentos consultados
arduamente em arquivos, vão aparecendo novas inquietações, e foi assim que, já
em 1980, com minha tese ao meio do caminho apareceu a AIDS, vinda de uma
mutação genética de um vírus que atacava espécies simiescas na África. Então,
logo que defendi o doutorado, iniciei uma nova pesquisa que levava em conta os
processos nosológicos da Idade Média, particularmente considerando que fomos
colonizados por portugueses oriundos desta Medievalidade.
Sim, eles trouxeram com a colonização,
doenças que não havia aqui, mas, para compreender melhor toda esta questão dos
itinerários da economia e da doença, precisei mergulhar fundo em infectologia e
epidemiologia. Valeram-me muito pessoas como o Dr. Veronesi e o Dr. Heitor
Medina, pois ambos me orientaram as leituras e a base de que eu necessitava.
Assim foram produzidos meus trabalhos sobre a lepra, sua chegada ao Brasil e
sua distribuição diferenciada por este país de dimensões continentais. Esta
árdua tarefa conduziu meus passos pelo continente europeu entre 1990 e 1991,
pois os arquivos que dizem respeito estão lá, e em nosso país não temos ainda
hoje a tecnologia fina para fazer diagnósticos retrospectivos em achados
cranianos de mais de um ou dois milênios. Arqueologia sofisticada, não é?
Depois que me aposentei em 2006, resolvi caminhar por fontes literárias para
compreender outro segmento da nossa colonização. Então, mergulhei de
ponta-cabeça na literatura Africana, pois a África foi uma das fontes da
estrutura populacional do Brasil, em virtude da escravidão.
Muitos foram os autores de África que consultei.
Falarei deles em outras colunas, mas hoje, estou de luto. Domingo, 17, faleceu
em Londres uma ativista da Rodésia do Sul, hoje Zimbábue, que lutou contra o
apartheid e escreveu dezenas de livros autobiográficos comprovando que os
caminhos da violência, das doenças, das ideologias e do comércio, coincidem
brutalmente. Doris Lessing, paro por aqui, em sua longa vida de escritora que
jamais perdeu de vista as tragédias encomendadas pela cobiça humana. Aos 94 anos, ela partiu tendo a honra de recusar o título de "Dama do Império Ingles" das mãos de Elisabeth II. Sabia das desgraças que qualquer imperialismo impõe aos povos.
Doris recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 2007.
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