quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

MINHA SÃO PAULO

Quando era pequena, morava no município de São Paulo que, amanhã, completa 559 anos. Na minha distante infância, tive a oportunidade de assistir a comemoração do quarto centenário (1954), e eu tinha apenas 8 anos. Naquela época, a do quarto centenário, o velho rádio de válvulas do meu pai ficava ligado muitas horas por dia. De manhã havia as rádio-novelas, produzidas em minúsculas salas com a voz e as bugigangas dos atores, cuja função era fazer os barulhos parecidos aos que teriam de cenário... e as mães de todos os lares choravam com as heroínas, vibravam com os heróis, odiavam os vilões. Enfim, era uma soma de vozes, ruídos, enredos, acrescentados da força imaginativa das ouvintes vorazes...

Hoje, é impossível a uma pessoa mais nova ter noção do mundo pré-televisão. A TV acabou com esse apelo imaginativo dando o serviço completo, rico de imagens, sons, belos artistas, cenários maravilhosos, tudo isso muito enriquecido com os comerciais que entram sub-repticiamente entre os diálogos e as cenas da montagem da telinha.

Outra coisa que os mais novos terão dificuldade de compreender, é o lado poético de uma cidade cortada pelos bondes, com iluminação precária, e sem os altos edifícios que hoje elevaram-se para atender à demanda de moradores cada vez mais abundantes na capital. Na verdade, mais do que uma simples capital administrativa, São Paulo tornou-se também a capital das oportunidades, o centro onde nada falta, do mais rico traje ao mais rico automóvel, das mais tonitruantes liquidações aos mais incríveis lugares de produtos contrabandeados e muitas vezes vendidos sobre panos brancos nas calçadas, passíveis da recolha truculenta dos fiscais, ainda que fazedores de alegres consumidores de música e óculos escuros.

Realmente, não há como comparar a velha São Paulo com a nova. E, eu, paulistana de nascimento, muitas vezes me sinto nostálgica da velha cidade. Havia menos gente e era muito mais segura. Nós íamos a festas , os bailes animados por grandes orquestras mandavam seleções musicais das 22,00 às 4,00 da madrugada e, então, nosso grupinho, de smoking e gala completa, sentava-se nos degraus do comércio fechado para bater papo até que o primeiro ônibus começasse a circular. Então, trajados qual pingüins e cinderelas, voltávamos aos nossos lares enquanto os trabalhadores iam ao trabalho. E nada disso chocava quem quer que seja.

Naturalmente, naquele tempo havia uma repressão de costumes mais ampla. Nos bailes, dançar de rosto colado já apontava para um futuro compromisso. As moças mais ousadas eram chamadas de Maria Maçaneta, e os rapazes que não perdiam uma seleção nem para tomar um ingênuo cuba-libre, tinham o apelido de arroz-de-festa. Os pais sabiam de tudo o que se passava com seus filhos, pois de quando em quando uma pessoa de mais idade “cismava” de querer ir ao baile, pois afinal, sentia saudades.

Saudade, eis o nome correto que eu dou à falta que me faz o sossego daquela época. Maconheiro, naquele tempo era batedor de carteira. Os automóveis não faziam o trânsito virar um inferno. E nós pensávamos no futuro, nas nossas profissões pois, naquela ingenuidade, queríamos um dia ser reconhecidos com nossos atributos de dedicação. E, São Paulo, terra boa, terra da garoa. Um beijo de aniversário no fundo do seu coração.E que obtenha de volta a paz que nos era tão cara.




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