terça-feira, 10 de abril de 2012

DELÍRIOS DE FÉ

Ganhou espaço na mídia a louca história do Judas de Itararé que, na encenação da Paixão de Cristo, acabou se enforcando de verdade. Não fosse o elenco descobrir o fato 4 minutos depois, lá se ia uma vida pelo caminho do teatro da fé. 4 minutos não é tempo demais?
Itararé é uma cidade pequena que fica no sul de São Paulo, divisa do Paraná. Morei em Itapeva alguns anos, o suficiente para perceber que a região tem carências enormes, senão de comida, pelo menos de inteligência. Enfim, acho que vão ter mais cuidado com o Judas da peça, pois o susto educa.
O que não dá para entender é o surto delirante de fé espetacular que vivemos no dia de hoje. Digo espetacular, porque as manifestações religiosas das diversas seitas cristãs que temos por aí, tornaram-se escandalosas, lembram a Marília Pêra no teatro interpretando Apareceu a Margarida, vários anos atrás. A diferença está no envolvimento do protagonista (padre, pastor e afins) com a platéia. Gritam eles e a platéia grita junto. Parece torcida de futebol, e coitado de quem mora perto. Esses teatros da fé não tem isolamento acústico e, queira ou não, somos submetidos a ouvir com regularidade o que se passa dentro dos vários templos religiosos.
Moro agora no ponto alto do Mogi Moderno. Quase frente a frente, concorrem para a perda da tranqüilidade do lugar uma mega construção da Assembléia de Deus e outra enorme igreja de Santo Antônio que chega às raias da insanidade de ter no campanário, alto-falantes para que as informações e as músicas juninas cheguem ao ouvido de toda a população.
Sou budista por convicção, e o meu nicho de manifestação exige silêncio. Porém, não sou respeitada, pois a igreja de Santo Antônio vaza o som das missas e cultos especiais direto para as janelas de casa. E o templo da Assembléia, faz exatamente o mesmo, quando os pastores berram ao microfone e os fiéis gritam nos chamados momentos de glorificação. Dia desses, tomei banho, vesti minha camisola (discretíssima aliás) e, como não conseguisse ler ou dormir, peguei um xale, joguei nas costas e fui andando pela calçada, abduzida pelo berreiro, até chegar aos degraus do templo. Do atrium, conferi: é isso mesmo, a Sociedade do Espetáculo se impõe a nós... Dias depois, a semana santa. O povo da vigília no sábado de aleluia fazia a igreja virar um show de gosto duvidoso. Santo Antonio protestaria.
O que peço humildemente a esses delirantes? Contenham-se. Afinal, aqui há gente de muitas religiões diferentes. Manifestem sua fé com mais discrição pois Deus tem bons ouvidos. Se não for pelo bom senso, terá que ser pela via da justiça. Afinal, a Constituição Brasileira dá igualdade de direitos a todos os fiéis, qualquer seja a sua fé.

3 comentários:

Jônatas Karamigo disse...

Na Grécia, anos atrás, um ator se enforcou na Semana Santa. Ele fazia o papel de Judas e se atrapalhou com a corda. Só que lá o sujeito morreu. Os gregos são mais dramáticos do que nós. Quanto a esses religiosos, eu acho que eles já torraram a paciência. Quanto menos as pessoas cuidam da própria vida, mais correm atrás de Deus. Abraços do Karamigo

Humanidade e Pensamento disse...

É isso aí, Karamigo, as pessoas deviam cuidar da vida que o saco de Papai do Céu deve estar cheio de bajuladores e vendilhões do Templo. Da minha parte, eu apenas gostaria de ter sossego. Ah, e quanto ao cara de Itararé que se enforcou, não houve socorro que prestasse nem fé que fosse suficiente. Ele morreu hoje, todo lesado no cérebro.
Em 23/4/2012.

Anônimo disse...

Seria o seu dia de azar? Eu não confiaria neste papel.