quarta-feira, 28 de novembro de 2012

FIM DE ANO * ACABE LOGO

Dou um sorvete de nozes e um bombom Koppenhagen a quem me disser que não está torcendo para 2012 acabar rápido. Aos meus amigos Europeus, Americanos, Brasileiros, Paulistas, Mogianos, que tem  o medo da crise econômica pesar-lhe às costas, eu desejo que dezembro passe num piscar de olhos para que o ano seguinte seja mais ameno em todos os sentidos, com mais paz, mais saúde, mais ofertas de empregos, e, porque não, fartura, pelo menos na mesa.

UM TEMPO PARA PENSAR

Quando uma pessoa que está sob os olhos da justiça e da nação é processada e condenada a uma pena de sete anos e dez meses de cadeia além de uma multa que, nós mortais comuns,jamais teremos, imaginamos: fazer o que? Ficar em algum trabalho durante o dia e ir para a cama exígua do presídio quando anoitece? Ver televisão? Ficar sem whiskie e jantar a comida feita atrás das grades?

Essas dúvidas são naturais pois na cabeça das pessoas normais, o lar é o recolhimento noturno, enquanto o dia foi feito para trabalhar muito e ganhar o sustento desse lar cujos impostos municipais, estaduais e federais levam quase a metade da renda. E as criaturas do povo não “lavam” dinheiro, não recebem propinas em troca de votos parlamentares, necessitando muitas vezes ter um segundo emprego para aumentar a renda da família.

Pois é, um político local muito conhecido foi condenado à pena acima pelo Supremo Tribunal Federal, e agora vai despejar o seu milhãozinho nos cofres públicos e mudar temporariamente seu modo de vida. Até que ponto, pergunto eu? Esse regime semi aberto não vai tirar o condenado das intrigas palacianas nem vai corrigir seus maus hábitos de fazer o que bem quer. Pior, vai ficar fora durante o dia para monitorar e tentar corromper os que investigam novas fraudes que podem lhe incriminar mais. Ora, não foi assim que sua vida se passou até hoje? Por que mudaria?

O Supremo foi benevolente com as penas que atribuiu na Ação 470. Penas baixas para grandes crimes, enquanto o populacho aplaude a esperteza do raposão-menino, e ainda vota nele e em seu partido como se ele tivesse de fato algum interesse em querer o nosso bem. Portanto, considero todos os seus eleitores igualmente condenados, e se isso é impossível pelo direito constitucional, pelo menos coloca uma tarja negra, a marca da indignidade , na manga de quem permitiu a ascensão política do rapaz.

Minhas dúvidas não ficam por aí. De que se ocupará o garoto durante o dia? Saberá ele assentar um tijolo para auxiliar na tarefa de construir casas a um povo que tem carência de habitação? Pintará paredes que ficaram imundas com as inscrições de moleques desocupados? Subirá nos andaimes dos mais altos edifícios da capital brasileira, a fim de limpar os vidros sujos pela poeira ou escorridos pela água das chuvas? Trabalhará em coleta seletiva de lixo ensinando aos cidadãos comuns como se separa o que é descartável? Ou mais, entrará em sala de aula para alfabetizar jovens que vem analfabetos desde as séries iniciais por conta da promoção automática no sistema de ensino? Todas as tarefas propostas são heróicas, nenhuma manchará a folha de serviços de um condenado a regime semi-aberto de prisão. Mas eu duvido que, uma pessoa que passou o tempo aos conchavos pelas esquinas da vida, queira de fato se dedicar a uma jornada de mortal comum. Não abrirá mão dos almoços sofisticados de Brasília, regados a bons vinhos franceses. Nem dos ternos impecáveis, menos ainda da vida de Don Juan cafona das terras tropicais. Não lerá um livro, se é que um dia já leu algum, nem se interessará em fazer um exame de consciência, pois isso não lhe foi ensinado.

Resta-nos o consolo de saber que foi condenado por obra de um honesto homem negro de origem humilde, e esse pesadelo ainda não terminou.Está aberta a temporada de caça aos ratos..
Foi Joaquim Barbosa o relator desse imenso processo 470 chamado vulgarmente Mensalão. Homem pobre, nascido em Minas Gerais, Paraopebas, tem 58 anos e é filho de uma família pobre de negros descendentes dos escravos roubados em África. Ter esse homem, que entendeu que só pelo viés do estudo poderia melhorar sua condição e a de sua família, significa reconhecer tacitamente que um negro humilde tem sim condições de condenar e fazer cumprir pena um delinquente de colarinho branco, político corrupto, ladrão do dinheiro do povo.
O Brasil estava a precisar ver a ordem das coisas se alterar. A cadeia que, neste país é só para pobre, preto e puta, agora vai ter que embalar as noites de branco, porco e ladrão enriquecido ilicitamente. 
E os Partidos políticos, doravante terão que fazer uma bela faxina em seus quadros para que a democracia persista nesta terra brasilis, sem pendores a qualquer tipo de fascismo.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

NADA SERÁ COMO ANTES

Só no Brasil acontecem coisas do tipo emendar uma quinta feira, feriado da República com a sexta, o sábado e o domingo e, como terça foi o dia da Consciência Negra, feriado em mais de 600 municípios, emendar também a segunda e a terça. Enfim, só nesta terra cabralina pode-se ficar uma semana inteira, em pleno mês de novembro, sem trabalhar, ou melhor, passeando ou mesmo coçando os escrotos no caso de quem os tem. E daí somos forçados a lembrar a língua afiada do falecido Marechal De Gaulle quando soltou esta pérola: “Il n’est pas un paìs serieux”. Os próprios brasileiros tem consciência de sua malemolência e de seu caráter festivo, mesmo em relação às coisas mais graves que acontecem. Lembram das piadas de mau gosto que nossa gente inventou quando aquele avião da TAM caiu atrás do aeroporto de Congonhas?

Um dos autores nacionais que eu curto bastante é o João Ubaldo Ribeiro, autor de uma alentada obra chamada “Viva o Povo Brasileiro”, onde retorna às origens da colonização de nossa terra, debochando dos nossos canibais que gostavam dos holandeses pois tinham a carne mais tenrinha que os portugueses e, depois, passa por uma saga familiar impressionante com direito a roubos, assassinatos, corrupção e uma infinidade de outros vícios mais, deixando o lado triste das coisas para os pobres, escravos e afins que, por sua vez tinham também sua malandragem bem desenvolvida para auto defesa dos grupos. Desta forma temos a sensação de que o Brasil é esse inferno tropical, um país cheio de maus costumes e de vagabundos.

Vagabundos, certamente os Brasileiros não são. O povo trabalha muito, enfrenta as desditas de um capitalismo selvagem e segue em frente, ficando feliz só em curtir uns feriadinhos a mais. E, na medida em que a população cresce, aumentam suas necessidades, pois as cidades em geral tem carência de infra estrutura urbana, de moradias, de creches, de preparo de mão de obra qualificada, de profissionais da saúde, de know how em pesquisas, de formação de cidadania, e por aí vai.

Agora, em plena época de julgamento dos réus do mensalão, quem quiser pode ver pela TV as cansativas sessões do Supremo Tribunal que tem um processo de mais de 50000 folhas, fora os apensos, onde estão registrados todos os depoimentos de acusados e testemunhas. Os ministros tem um desgaste que não é conhecido do povão. Estão lá eles preocupados com a corrupção nacional quando querem ver os times de futebol se preparando para uma inoportuna Copa do Mundo? Ora, não temos dinheiro para essas firulas, quanto mais para uma Olimpíada a seguir, e o mundo mergulha numa crise que vai se equiparar logo logo à de 1929. Na sombra da inconsciência popular, lá querem saber se o Marcos Valério pegou mais de 40 anos de cadeia e se o Zé Dirceu vai ficar um bom tempo vendo o sol nascer quadrado? Isso passa para o segundo plano.

O impeachment do Collor foi mais animado, carnavalesco mesmo. Um ano ele posava de Indiana Jones, dali a dois estava pintado na cara de todos estudantes o seu bota-fora. E as pessoas achavam que a corrupção parava por ali. Agora, vê-se que não. A oposição chegou ao poder precisando de reparos morais em seus quadros. Mas o julgamento do mensalão e outros que vem por aí, secundados por uma bela crise econômica, darão conta de operar o milagre. Desta vez, “nada será como antes”.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

SAUDADES DA INFÂNCIA

Quando eu era garota, morava com meus pais e irmãos numa linda chácara que ficava ao lado do Horto Florestal, em São Paulo. A moradia ficava num canto ao fundo. Espaçosa, tinha um jardim de inverno com deliciosas poltronas onde eu me jogava para ler. Mas o terreno da chácara era muito convidativo às brincadeiras infantis. Meu pai, vindo dos camponeses de Portugal, mantinha ali um pomar requintado e jardins muito enfeitados com arbustos recortados em topiaria fina. Ali era o meu jardim das delícias. Dava para brincar de bicicleta por todos os caminhos que meu pai fazia entre as plantas e ao longo da cerca viva de hibiscos, também cuidadosamente modelados. Entre tres imensos abacateiros, ele fez um tipo de estar com dois bancos confortáveis de cimento. Era o cenário ideal para meu irmão e eu brincarmos de circo, para minhas bonecas ganharem vida na casinha que eu improvisava.
Eu entrava na chácara por uma alameda bem cuidada cuja beirada fora feita em tijolos, limitando assim uma fileira de hortensias de cores variadas em ambos os lados. Havia buchinho recortado nas pontas, muito melindro. Cá e lá erguiam-se touceiras de giesta e em novembro, floresciam os jasmins. No fundo havia ainda um pomar com laranjas lima, lima da pérsia, muito caqui. Mas delicioso mesmo era o mes de novembro. Mais de uma dezena de jabuticabeiras que o meu avô plantara, ficavam com os troncos cobertos de jabuticabas muito docinhas, que nós comíamos no pé, colhiamos para fazer doces, geléias e licores, mas parecia que as frutas não acabavam mais. Então, meu pais abria o imenso portão da chácara e chamava os vizinhos para virem colher frutas e aproveitar a safra.
E havia também, bem perto do jardim de inverno, duas oliveiras. Uma velhísima e outra mais nova. Estas eram podadas na véspera do Dia de Ramos, e os galhos ficavam no chão para que cada vizinho pegasse os seus Ramos e levasse à missa no dia seguinte. Vivi neste Éden até os 16 anos, quando, mesmo sem Caim ter matado Abel, meu pai teve tres enfartes e fomos expulsos do paraiso. Que tristeza encarar o mundo de fora, a moradia com barulho que perturbava o sono, a insegurança pela saúde claudicante do paí e pela necessidade de trabalhar para haver comida sobre a mesa. Trabalhar não era mau, eu já o fazia desde os 14 anos, mas a insegurança que se abateu sobre mim foi tão grande que eu acordava muitas vezes chorando de medo, mesmo tendo meu paizinho a dormitar a poucos metros de mim. E ele , apesar dos enfartes, sobreviveu até os 91 anos. A mais linda lembrança que tenho dele foi de sentar na beira da poltrona onde ele lia jornal, e apontar com meus dedinhos minúsculos as letrinhas perguntando o que queriam dizer. Assim aprendi a ler. E, com a doença dele, mais tarde, aprendi a ser gente grande.

REPÚBLICA E CONSCIÊNCIA NEGRA

Quando a Princesa Isabel, regente do trono Brasileiro no lugar de seu pai, o Imperador Dom Pedro II, assinou a Lei Áurea que proibia a partir de 13 de maio de 1888 todo e qualquer tipo de escravidão negra no Brasil, uma das autoridades presentes no momento disse-lhe cortesmente: Vossa Majestade redimiu uma raça mas perdeu o seu trono! Foi assim que eu aprendi na escola desde o curso primário, e para mim tudo não passava de uma questão abstrata pois, sendo filha de imigrantes e morando no Horto Florestal, tinha na minha escola uma variedade de colegas com todos os tipos de cor de pele. Na hora do recreio brincávamos juntos e normalmente eu voltava para casa com uma coleguinha um pouco mais velha chamada Maria da Penha que era negra com os dentes brancos mais bonitos que já conheci. Mais tarde, quando meus pais me mandaram para o Colégio das Freiras, não havia nenhuma colega negra e, mesmo entre as brancas, não era com todas que eu podia brincar. As laristas, por exemplo, sentavam nas últimas carteiras e eram impedidas de nos dirigir palavras, pois estudavam naquela escola por “caridade” das irmãs e pertenciam a outra extração social.

Na verdade, a República aconteceu pelo desgaste natural da monarquia e pelos avanços do positivismo. Os grandes senhores de terra vinham a tempo buscando imigrantes europeus para suprir suas lavouras, e os negros acabaram marginalizados como qualquer gente branca miserável que andasse por aí. Então, esta passagem institucional do Império à República pouco alterou na doença que já havia no Brasil de então: a desigualdade social ultrajante entre as pessoas mais abonadas e os pobres.

Durante o século XX a miscigenação fez pelo povo um arco-iris de biótipos, de modo que nos dias de hoje, fica mais difícil encontrar um negro realmente negro ou um branco completamente branco. O Brasil não conheceu o Apartheid da África do Sul nem teve que se confrontar com as guerras tribais que a África enfrentou em virtude da descolonização. No entanto, nesta miríade de cores de pele do povo brasileiro, ainda é verdade que os tons mais claros de pele estão no alto da pirâmide social, e a morenice vai se acentuando na medida que a base da pirâmide se alarga.

Então, em tempos politicamente corretos, o governo Brasileiro resolveu que havia uma dívida para com os afro-descendentes. E a República Brasileira, com o escopo de tentar a redenção, criou o dia da Consciência Negra, tendo como continuidade o regime de cotas nas Universidades e a criminalização do preconceito racial. Fico profundamente incomodada com o caráter cínico das coisas políticamente corretas, uma vez que o acesso à universidade é negado não aos mais negros, e sim aos que estudaram em escolas públicas onde se perdeu todo o pudor de ensinar e respeitar. Um dos meus alunos mais brilhantes era afro-descendente, seguiu meu rumo de Estudos Medievais e doutorou-se com brilho na USP. Hoje, o José Rivair é professor da UFRGS. Como ele, tem o Ramatis Jacino, pós graduado pela USP quando já estava formando filhos em Universidade. Posso citar muitos mais, hoje homenageio a todos através de ambos. Foi a garra que fez deles os gênios que são. Ambos tem compromisso com a justiça social, não aquela do maniqueísmo medíocre, mas aquela que só gente do Trabalho consegue ter. A da luta de classes!